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É democraticamente imoral esta encenação do presidente da República "ouvir" os partidos, os parceiros sociais e personalidades e "só depois dirá se aceita ou não a solução governativa proposta pela coligação ou marca eleições", como escreve uma ilustre jornalista no Expresso, quando sabemos que, ontem, na reunião do Eurogrupo, a novata ministra das Finanças informou os seus pares que " a crise política já estava resolvida", recebendo em troca muitos beijinhos e abraços. Toda esta palhaçada corrói a confiança dos portugueses na democracia.
Depois de mais de uma semana fora, amanhã de manhã cedo vou voltar à minha aldeia, às minhas galinhas, patos e gansos e aos meus gatos. Já tenho muitas saudades. Mas, tenho que confessar: perante o marasmo e o cinzentismo de tudo isto, gostei do "golpe de Estado" de Paulo Portas. Não vai resolver nada de essêncial, mas ver o cardeal patriarca, Wolfgang Schäuble e Cavaco Silva rendidos a um acordo de coligação que representa a maior humilhação que um líder do PSD e que um partido sofreram nos últimos 38 anos, deixou-me bem disposto.
Que os governos português e espanhol tenham impedido a escala ou uso do espaço aéreo ao avião presidencial de Evo Morales, da Bolívia, compreende-se. Rajoy, é amigo político de Aznar, e Passos Coelho é amigo político de Durão Barroso. Aznar e Barroso estiveram juntos, nas Lages, com Bush a preparar a invasão do Iraque. Mas que Hollande, o presidenete socialista da França, tenha interditasdo o espaço aéreo francês ao avião do presidente da Bolívia mostra bem o estado de degenerescência democrática e de servilismo em que a Europa se afunda.
Escrevi por aí que o "novo" governo, primeiro, foi receber a bênção da Igreja, nos Jerónimos. Só depois irá receber a bênção da República, em Belém. Por pressa ou desatenção democrática omiti que, depois da Igreja, e antes do presidente da República, faltava ainda a bênção da capital do Império. Essa bênção chegou hoje de Berlim. O ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, aprovou o acordo e diz que ficou descansado. Que descanse em paz, digo-lhe eu.
Vítor Gaspar abandonou o governo derrotado pela sua própria estratégia e levou Passos Coelho na água do banho, mesmo que o primeiro-ministro se mantenha em funções por mais algum tempo. Na carta de demissão, o ex-ministro das Finanças admite que o incumprimento das metas do défice orçamental “foi determinado por uma queda muito substancial da procura interna e por uma alteração na sua composição que provocaram uma forte quebra nas receitas tributárias. A repetição desses desvios minou a minha credibilidade enquanto ministro das Finanças”. Exactamente o que o país repetia diariamente há mais de um ano. As evidências estoiraram com a receita de Vítor Gaspar, benzida por Passos Coelho, o que – em tese – permite a Paulo Portas substituir, enquanto “ideólogo”, o ex-ministro das Finanças, com o apoio discreto de ministro do PSD, sobretudo Poiares Maduro e Santos Pereira, e meter dentro de um armário, fechada à chave, a nova ministra das Finanças. Assim, a parte do governo derrotada no conselho de ministros de Alcobaça poderia comandar esta nova fase do governo e dar-lhe um novo folego. Só que a reacção dos derrotados, Passos Coelho e Cavaco Silva, é imprevisível a partir de agora. Se o primeiro-ministro se deixar comandar, como até aqui, pelo número dois do governo e o presidente da República mantiver a mesma defesa da “estabilidade política”, este novo governo pode passar o cabo das eleições autárquicas e do próximo orçamento de Estado.