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João Villalobos e Luís Naves juntaram-se à volta de Emoções Básicas. No tempo do Grand Hotel é um bom aperitivo.
Eça de Queirós morreu há cem anos. Uma pessoa devia voltar-se para trás, para a estante, retirar um Eça e ler. Se não tiver um à mão — é uma vergonha.
Em Março deste ano, ainda não se passaram meia dúzia de meses, no discurso de encerramento do último congresso do PSD, Pedro Passos Coelho, eleito presidente dos social-democratas, referiu-se à necessidade de uma revisão constitucional, como medida indispensável no combate à crise que nos assola. Alguns meses depois, cumprindo o que disse, foi derramando em entrevistas o essencial do projecto social-democrata, o qual foi submetido a algumas cirurgias internamente até ser aprovado em Conselho Nacional. Uma ou duas semanas depois, e debaixo de uma demlidora avalanche de criticas ao dito projecto de revisão constitucional, o PSD caiu 10% no barómetro da Marketest, o que foi comprovado por outras sondagens. Ontem, no Pontal, em Quarteira, local da rentrée politica do PSD, Passos Coelho, no seu discurso, não disse uma única palavra sobre a necessidade da revisão constitucional. Ficámos, assim, sem saber se, para Passos Coelho, a crise desapareceu milagrosamente no último mês ou se, o que faz mais sentido, o presidente do PSD ainda não encontrou a «solução» para combater a crise. Neste momento, abandonar o projecto de revisão constitucional é pior do que o ter apresentado nos termos em que o fez: ninguém se esquece da proposta apresentada e revela falta de convicção ao escondê-la debaixo do tapete.
A soldado desconhecida, Ferreira Fernandes, DN, 12.08.10:
Josefa, 21 anos, a viver com a mãe. Estudante de Engenharia Biomédica, trabalhadora de supermercado em part-time e bombeira voluntária. Acumulava trabalhos e não cargos - e essa pode ser uma primeira explicação para a não conhecermos. Afinal, um jovem daqueles que frequentamos nas revistas de consultório, arranja forma de chamar os holofotes. Se é futebolista, pinta o cabelo de cores impossíveis; se é cantora, mostra o futebolista com quem namora; e se quer ser mesmo importante, é mandatário de juventude. Não entra é na cabeça de uma jovem dispersar-se em ninharias acumuladas: um curso no Porto, caixeirinha em Santa Maria da Feira e bombeira de Verão. Daí não a conhecermos, à Josefa. Chegava-lhe, talvez, que um colega mais experiente dissesse dela: "Ela era das poucas pessoas com que um gajo sabia que podia contar nas piores alturas." Enfim, 15 minutos de fama só se ocorresse um azar... Aconteceu: anteontem, Josefa morreu em Monte Mêda, Gondomar, cercada das chamas dos outros que foi apagar de graça. A morte de uma jovem é sempre uma coisa tão enorme para os seus que, evidentemente, nem trato aqui. Interessa-me, na Josefa, relevar o que ela nos disse: que há miúdos de 21 anos que são estudantes e trabalhadores e bombeiros, sem nós sabermos. Como é possível, nos dias comuns e não de tragédia, não ouvirmos falar das Josefas que são o sal da nossa terra?
O Francisco é de opinião que, neste meu post, onde concluí que os portugueses estão cansados de circo a partir de uma sondagem do Expresso sobre o processo Freeport, há «um pequeno, ligeiro equívoco» (Já antes, o João Gonçalves tinha feito, a propósito, uma observação e, no Domingo, o Tiago Mota Saraiva, no Combate de blogues, também me chamou a atenção mais ou menos no mesmo sentido). Longe de mim a veleidade de nunca me enganar ou de raramente ter dúvidas e de saber, tal como o Francisco, que os veredictos, em países civilizados, não vão a sondagens. E acontece que a opinião pública não é propriamente o fiel da balança quando se trata da lei. No entanto, insisto: o que me ressaltou dos resultados da sondagem citada foi a quase unanimidade dos inquiridos sobre a longevidade do processo nesta sua fase de inquérito, apesar de notar que as perguntas estavam formuladas para a resposta vir a reboque. Isto quer dizer que, em meu entendimento, em termos de «opinião pública», e passados seis anos, não se sente o sentimento de «apure-se a verdade independentemente do tempo que levar». A violação permanente e diária do segredo de justiça, transformando uma investigação num «circo mediático», e a sua longevidade sem obter resultados de monta, conduz inevitavelmente à percepção do uso da investigação para fins políticos e, consequentemente, ao seu descrédito enquanto investigação. É deste «circo» que o pessoal está cansado. Não tem nada a ver com veredictos ou com leis.
Adenda: A Ana Cristina Leonardo também não perdeu oportunidade de me chamar a atenção para o tempo em que «a malta sabia que a política era uma puta velha e não uma inocente virgem». Só que neste imbróglio eu tenho dúvidas sobre quemrepresenta o papel de «puta velha» e quem faz de «inocente virgem».
A avaliar pela sondagem de Agosto Expresso-SIC-RR/Eurosondagem, a opinião dos portugueses em relação ao «caso Freeport» é elucidativa. 60% dos inquiridos acham bem que José Sócrates não tenha sido acusado e apenas 27.2 % veriam com bons olhos uma acusação ao primeiro-ministro. Quanto ao tempo de duração da investigação no processo Freeport, mais de 81,5% é de opinião que devia ter encerrado há mais tempo, enquanto 86,5% acha que devia haver um prazo limite para se concluir uma acusação. Estamos perante uma opinião inequívoca, em qualquer das três questões colocadas: o pessoal está cansado de circo.
Neste começo de Agosto, com metade dos portugueses a banhos e a outra metade a meio-gás, para além de Pedro Passos Coelho ter recolhido a sua proposta de revisão constitucional, o mais relevante acontecimento político foi o grito do Ipiranga do Procurador-Geral da República, nas páginas do Diário de Notícias. Seguiu-se, em resposta, uma «carta aberta» dos sindicalistas do Ministério Público. O teor das duas intervenções deixa claro duas coisas. A primeira: foi tornada pública a luta surda que há muito tempo se trava, entre o Procurador-Geral e o Sindicato, pelo comando efectivo do MP (parece que os poderes formais da «rainha de Inglaterra» se subordinam aos poderes informais do Sindicato); a segunda: a crise do MP (parte importante da crise da Justiça), agora na praça pública, merece a atenção, com carácter de urgência, de quem detém legitimidade democrática para decidir sobre o tema: o poder político, governo e oposição. Deixar em banho-maria esta situação significa agravá-la em cada dia que passa. Sempre que, em democracia, polícias (ou Exército) pretenderam controlar o poder político deu para o torto.
O Procurador-Geral da República, em entrevista ao DN, diz o que é evidente:
1. «É absolutamente necessário que o poder político (seja qual for o governo e sejam quais forem as oposições) decida se pretende um Ministério Público autónomo, mas com uma hierarquia a funcionar, ou se prefere o actual simulacro de hierarquia em que o procurador-geral da República, como já vem sido dito, tem os poderes da Rainha de Inglaterra e os procuradores-gerais distritais são atacados sempre que pretendem impor a hierarquia.
2. É imperioso que se diga que modelo se deseja para o País: Se um sistema em que o Sindicato quer substituir as instituições ou um Ministério Público responsável. É preciso que sem hesitações se reconheça que o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público é um mero lobby de interesses pessoais que pretende actuar como um pequeno partido político.»
A saúde da democracia exige que PS e PSD discutam, em conjunto, esta chaga em que o Ministério Público se transformou e encontrem uma solução.
Mendes Bota, líder do PSD/Algarve, em conferência de imprensa, hoje, em Portimão, condenou a privatização de 49% da Empresa Municipal de Águas e Resíduos proposta pelo executivo municipal, presidido pelo PS. O argumento do PSD foi o seguinte: «além de considerarmos que a água é um bem essencial e estratégico, devendo estar sob a alçada pública, a mesma é fruto de importantes receitas municipais».
O Rodrigo Moita de Deus «explicou-nos», ontem, que devia ser o primeiro-ministro a tomar a iniciativa de ir bater à porta do MP e responder às perguntas que, eventualmente, os senhores procuradores lhe quisessem fazer. Garantias dos cidadãos em direito penal, com centenas e centenas de anos, como «presunção de inocência» ou «ónus da prova» são tábua rasa neste país.