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O pelouro das golpadas foi entregue ao vereador Hugo Chávez que já colocou «os militares venezuelanos em alerta» e ameaça fazer tudo o que tiver de fazer «para que Manuel Zelaya seja restituído ao seu cargo"».
José Simões, Der Terrorist.
No i de hoje, Henrique Granadeiro lembra a actuação de governos idos, cujos protagonistas, hoje, querem parecer imaculados: «Já parecem esquecidas as tentativas de intervenção do governo PSD na Lusomundo, que levaram à minha demissão». Granadeiro não chegará a santo, como Nuno Álvares Pereira, mas isso não o impede de ter memória, um bem escasso entre muita gente.
No Domingo à noite, já os jovens social-democratas pulavam à corda na sede do PSD, tive uma surpresa: a minha prima Hermenegilda, sem aviso prévio, bateu-me à porta, o que não acontecia há quase uma dezena de anos. Telefona-me com frequência, deliberadamente quando estou a assistir a um jogo de futebol; almoçamos meia dúzia de vezes por ano, se tanto, invariavelmente no Bairro Alto, mas bater-me à porta «espontaneamente» estava fora dos seus hábitos. Entrou com o à vontade de quem conhece os cantos à casa, exibindo as mamas pródigas que lhe saltavam do vestido decotado e o último marido, figura esguia, com uma farta cabeleira a esbranquiçar, uns óculos de aros redondos, e um ar distante ou apalermado, não entendi bem. «Ia a caminho do Café de S. Bento, vi luz e decidi ver se estavas em casa. Há muito tempo que não almoçamos» – Disse-me, com ar sonso. Apeteceu-me dizer-lhe que estava mais gorda, para me ressarcir da intrusão, mas contive-me. Sem cerimónias, sentou-se e, enquanto esboçava um sorrisinho hipócrita para o marido, disparou: «Que grande derrota do teu partido. Ainda és apoiante do Sócrates?». Adivinhei os sarilhos em que a conversa podia descambar, e suavizei a resposta: «A democracia é isto, querida prima.» - Respondi. Ela, com o azedume que lhe brota das frustrações, e com trejeitos a imitar Manuela Moura Guedes, interrogou-me: «Democracia? Qual democracia? Explica-me a diferença entre a democracia socratista e a democracia de Pinochet?» E olhou para o marido, sentado a seu lado, coçando a barba rala, como a pedir-lhe aplausos. Ele (nem sequer fixei o nome) balbuciou: «É verdade, mas o exemplo corre o risco de branquear a ditadura de Pinochet». Olhei, condescendente, aquele «par de jarras» sentados no sofá à minha frente, enquanto a vida da Hermenegilda me passou pela cabeça, como um filme. Recordo-me bem quando, em Abril de 1973, procurava uma casa insuspeita para esconder um amigo, procurado pela PIDE, por meia dúzia de dias, os suficientes para sair do país em segurança, e tive a infeliz ideia de me lembrar da Hermenegilda. «Andas metido com os comunistas e queres estragar a minha vida, mas eu não permito» – Disse-me roborizada. E, agora, está aqui a fazer comparações disparatadas, como se eu não a conhecesse. Afastei os meus pensamentos porque Hermenegilda não apreciou o meu silêncio, e continuou a falar: «A esquerda já tem mais de 20% dos votos. E vai continuar a crescer. Se o Manuel Alegre se decidisse partir o teu partido este país podia dizer adeus ao capitalismo». Com ar apaziguador, ainda lhe disse: «Hermenegilda estas eleições contam pouco, esperemos pelas legislativas». Ela, levantou-se, acomodou as mamas para dentro do decote, e ripostou: «Pareces esse tal Vitalino Canas a falar. Vou-me embora. Vim cá para te avisar que o capitalismo está no estertor final, aqui e em todo o mundo». O marido levantou-se, e de mão dada, desampararam-me a casa, depois de eu espreitar para dentro do decote na despedida. Não suporto a minha prima Hermenegilda, uma típica pequeno-burguesa radical que passou os cinquenta anos de vida sem nunca ter trabalhado. Mas é a única prima que tenho.
(Texto publicado em primeira mão, no dia 10 de Junho, no blogue do Tiago Moreira Ramalho (O afilhado).
Pacheco Pereira tem um novo programa, sobre opinião – Ponto Contra Ponto, na SIC Notícias. Um programa de "opinião, opinião, opinião." A minha opinião: nenhuma opinião vale mais, em Portugal, que a de PP. Alguém que lembra a importância da hesitação no discurso televisivo de Vitorino Nemésio (a quem PP dedicou o seu programa) deve ser escutado. É uma luta necessária, a de PP, contra o "demasiado espectáculo e a pouca razão" na Comunicação Social portuguesa. Mais uma razão para o criticar. No primeiro Ponto Contra Ponto, PP abriu as páginas de procura de emprego do Correio da Manhã, de 26/06/2009, para concluir sobre os maus tempos em que vivemos. Fui ver esse CM: havia 52 anúncios de procura de emprego. Há 15 anos, o CM de 27/06/94 (não escolhi o de 26 porque foi domingo) tinha 104 procuras de emprego. Julgo que seria pouco razoável – PP até diria mais: situacionista! - alguém dizer, à luz dos anúncios do CM, que ao fim de nove anos de Governos de Cavaco (1985-1994) havia o dobro de desemprego que temos hoje... Conclusão: em televisão, abanar as páginas de anúncios de um jornal é demasiado espectáculo. Nemésio hesitaria, pensava e não o faria.
Ferreira Fernandes, DN, 30.06.09.
Eu entendo que o Avante, enquanto órgão central do PCP, expressa a opinião do partido, como aqui referi. No entanto, dois militantes comunistas, que muito respeito, dizem-me, por e-mail, que este entendimento é arqueológico. Não só do ponto de vista político, mas também do ponto de vista funcional ( «devia ser óbvio que articulistas e cronistas, incluindo no Avante!, abordam uma míriade de temas e assuntos que jamais qualquer órgão partidário responsável terá tempo para analisar ou definir posição.») . Concordo e registo. Mesmo no Avante, cada articulista é responsável pela sua prosa. Aliás, na semana anterior foi publicado um texto não assinado, onde se escrevia: Milhares de iranianos protestaram em Teerão contra o regime despótico, exigiram liberdade e democracia e contestaram a reeleição de Mahmud Amadinejad. De qualquer modo, o que escrevi não é displicente, já que se encontram no Avante vários exemplos que catalogam de «trapalhada», por exemplo, situações em que o primeiro-ministro e um ministro dizem coisas diferentes sobre o mesmo assunto. Digamos, pois, que apenas estamos perante uma «trapalhada».
Nuno Ramos de Almeida, quase sem querer, estou certo disso, comunica por sound bytes «à moda antiga», o que é como quem diz, à moda utilizada na propaganda do KGB (anteriormente NKVD), desde os tempos dos processos de Moscovo: quem não está de acordo com a linha do partido é agente da CIA. É uma questão de cultura política. Daí, talvez, os sound bytes tipo «émulos de Pinochet» ou a «Pinossócrates» atirados à parede, como quem pensa a preto e branco, ou apenas para intimidar e desvalorizar uma opinião diferente. Não é que falte a Nuno Ramos de Almeida inteligência (e informação) para discernir os meandros políticos que, em Tegucigalpa, se foram tecendo até ao contra-golpe militar, sobretudo o comportamento golpista e anti-democrático (há partidos políticos e outras instituições democráticas no país, nomeadamente o Congresso e os tribunais) de Manuel Zelaya, numa tentativa de passar por cima das regras democráticas para se perpetuar no poder. O presidente hondurenho deve regressar ao seu cargo até às próximas eleições e os militares aos quartéis, mas não nos atirem areia para os lhos. O «equilíbrio» está no ponto intermédio, contra os extremos perversos, terá escrito Aristóteles. A cartilha marxista é outra!
O Jornal Avante é – diz no cabeçalho – o órgão central do PCP. Por isso, as posições expressas, mesmo assinadas individualmente, certamente reflectem uma posição colectiva: a posição do partido. Vem isto a propósito de um texto assinado por Jorge Cadima, no último Avante, no qual o seu autor, num estilo a roçar a demência «de classe» – do tipo «julgam que na Florida há mais democracia do que no Irão? – se coloca religiosamente ao lado do bando de reaccionários dirigidos por Ali Khamenei, do Conselho dos Guardiões e do Conselho de Discernimento do Interesse Superior do Regime iraniano. Cito: «Dizem-nos que houve fraude eleitoral. Também nos disseram que havia armas de destruição em massa no Iraque.» Ou seja, não houve fraude eleitoral no Irão, segundo os comunistas. Em consequência, os protesto do povo iraniano são infundados e a sangrenta repressão está conforme a «legitimidade democrática» do poder instituído. O PCP envelheceu tanto e defende tanto o modelo totalitário soviético que qualquer ditadura, mesmas as mais ignóbeis, são democracias aos olhos dos seus militantes. Já tínhamos, como paradigmático, a «democracia» norte-coreana. Agora, podemos acrescentar a «democracia» iraniana. E, depois, levam dias inteiros no Comité Central à procura das razões da ultrapassagem eleitoral do BE.
Hoje chegou a notícia de um «golpe de Estado» nas Honduras, acontecimento «pouco apropriado» nos dias que correm, apesar das tradições latino-americanas. Os militares foram ao palácio presidencial e levaram o presidente, Manuel Zelaya, eleito em 2005, pelo Partido Liberal, depositando-o, literalmente, na vizinha Costa Rica. Mas estas «histórias» nunca são lineares. Manuel Zelaya termina o seu mandato este ano e a Constituição hondurenha não lhe permite a reeleição. Mas ele não estava de acordo com a Constituição. Estorvava-lhe o projecto de poder pessoal. E tentou, contra o partido pelo qual foi eleito, contra o Congresso, eleito democraticamente, e contra o Tribunal Constitucional, um «golpe de Estado» à Chávez, com o qual começou a ter estreitas relações desde 2007, e que o inspirou a realizar um referendo que o perpetuasse no poder. Em boa verdade, os militares hondurenhos, hoje, ao contrário do que escrevem os jornais, foram protagonistas de um «contra-golpe» e não de um «golpe de Estado». A via chavista para a ditadura nem sempre funciona.
Qualquer das formas, a partir de hoje, Sidadi Velha é Património Mundial da Humanidade.
António Pinto Leite assina hoje no Expresso uma texto curioso do ponto de vista do argumentário político. Escreve: «Na percepção comum, o PS virou à direita. O eleitor moderado, sobretudo se cansado deste governo, é sensível a quem é o original e quem é a cópia». Mas, três parágrafos abaixo, escorrega no raciocínio e escreve: «Basta ter estar atento ao seu discurso na campanha que a levou líder do PSD para perceber as suas convicções e a instintiva leitura social-democrata que faz das soluções para Portugal». É caso para dizer: para uma «leitura social-democrata» talvez o eleitorado seja, de facto, mais sensível «a quem é o original e quem é a cópia».
Há quem se preocupe com os custos da democracia, principalmente das eleições. Talvez não saiba quais são os pesados custos das ditaduras. Quando falamos de eleições, a «poupança» não é argumento.
Os Passos da Cruz, de Nuno Júdice (Dom Quixote) é uma novela que parte da história de uma ignorada mulher do século XVII, de nome Antónia Margarida, para fazer, através de lugares próximos, entre Coruche e Almeirim ou nos cafés nas imediações da cidade universitária, um cruzamento/fusão fantástico entre tempo e espaço, situações remotas e próximas, a realidade e a ficção e personagens que se identificam nas escolhas, seja a Revolução ou o Convento, Lenine ou Cristo.
Cavaco Silva não arriscou marcar as eleições legislativas no mesmo dia das autárquicas, como era seu desejo. E não arriscou por um simples motivo: as consequências eleitorais ao assumir publicamente a liderança do PSD. Ainda é cedo. 27 de Setembro é, pois, o dia que vai marcar o início de um novo ciclo politico: o ciclo da instabilidade governativa. Ainda por cima em tempos de vacas magras. Estão desenhados os contornos: um governo socialista com maioria relativa e uma oposição cerrada, no Parlamento, à direita e à esquerda; ou, em alternativa, um governo presidencial, também de maioria relativa, com a implacável oposição de uma «maioria de esquerda» no Parlamento. Numa ou noutras das soluções, a instabilidade e a paralisia governativa vão ser o pão-nosso de cada dia, com a recuperação da economia real a gemer por muito tempo. Mas é difícil fugir a estes contornos nos próximos dois anos. As presidenciais passam, então, a ser a chave do «problema». O presidente eleito terá de dissolver a Assembleia da República, a meio da legislatura, e aproveitar a «sua» maioria para a transformar em maioria parlamentar. Não é preciso comprar um GPS para conhecer o caminho: se o PSD ganhar as próximas eleições legislativas e, em consequência, se formar um governo presidencial, Cavaco Silva pagará a factura da governação. Manuel Alegre reforçará, então, as suas possibilidades de vir a ser o próximo presidente da República, resultado impensável noutro contexto. O que significa que o novo ciclo político vai durar apenas dois anos, na melhor das hipóteses. A coisa promete… fortes ventanias no litoral e neve nas terras altas.
Depois de tantos anos a trabalhar para ficar branco, um preto chega à presidência dos EUA.
Manuela Ferreira Leite prometeu «rasgar e romper com todas as soluções que têm estado a ser adoptadas em termos de política económica e social». Se o PSD ganhar as eleições legislativas vamos voltar aos 60 anos como idade de reforma. A sustentabilidade da Segurança Social que se lixe, agora estamos a tratar de votos. Depois não venham dizer que «não era bem isso que eu queria dizer…».